30.8.08

Filosofia de geladeira

Entender de si é muito mais estranho do que sublime. É cavucar um buraco sem fim e tirar de dentro um tudo que nunca acaba, mas também não preenche. Um vazio cheio de tranqueira, mas também de poesia.

Destampar o ralo da alma é para que tem coragem de experimentar. Vivenciar o novo, já que o que é já se sabe como é e se o diferente for melhor, é uma oportunidade, se for pior, é só escolher o antes.

O processo da viagem universo a dentro é árduo e sinuoso, tão compreensivel quanto o é para uma criança de 6 anos um plano de saúde. Embora completamente auto-explicativo, encontrando em seu meio toda a justificava pro fim e principalmente pro começo.

Enquanto desprego da cortiça de minha memória fotos antigas e desbotadas, releio acontecimentos de minha história e encontro linhas nunca antes lidas, muito menos interpretadas.

Vou perdoando e me perdoando pelos que pareciam os piores erros de um sem fim e agora encaixam-se uns em outro, plenos de significado.

Minha identidade se desfaz em fotos 3X4 de olhos arregalados e sorriso oco, noentanto a lembrança da menina tímida, da adolescente rebelde, da mulher complicada exibem o mesmo olhar...

O olhar que derrama meu ser em uma ansiedade imensurável, invispivel e indeletável: a ansiedade de ler todos os livros, ouvir todas as músicas, ver todos os filmes, conhecer todos os lugares, milhares de pessoas, cada recôndito bucólico de tempo, espaço ou existência.

Abro a geladeira, filosófo. Procuro uma ideologia, alguma coisa doce, um caminho. E encontro garrafas de água embaçadas, manteiga pela metade e oito tapeware de dúvidas. Continuo flertando com as prateleiras vazias, em busca de qualquer coisa que preencha este vazio que me dá, de sexta a noite, quando não consigo parar de me analisar.

SAT NAM ;)

26.8.08

Se fosse...

Se fosse música, hoje seria uma melodia calma, daquelas que derrete a casca dura da ferida imperceptível que o dia-a-dia causa. Num rítmo que abraça, acalenta, acolhe, levando a alma numa dança leve, solta, singela e real.

Se fosse parte, hoje seria asa. De anjo, borboleta ou libélula, de bem-te-vi, gaivota ou beija flor. Seria asa batendo devagar, firme no ar, longe do chão. Seria asa que plaina, flutua, destila o mar de nuvens e esfria o corpo no alto do todo, longe e perto de tudo.

Se fosse gente, hoje seria criança, brincando tranquila, sem pressa nem sabedoria, derrubando inocência, extravasando ternura. Oferecendo sorrisos ao acaso, por descaso, por acaso.

Se fosse elemento, hoje seria água. Choveria gotas lânguidas num beijo úmido e fértil. Correria rios caldalosos e desaguaria, sem receios, no oceano. A-mar-ia, sem parada, sem barreira, sem fim. Me jogaria em cachoeira, queda d´agua, força e harmonia.

Se fosse manhã, seria sol. Se fosse noite seria lua cheia. Se fosse obra, seria de arte, se fosse tempo seria feriado. Se fosse santa, seria louca. Se fosse ela, seria outra. Se tanto, pouco. Se dúvida, o suficiente. Se copo, inteiro vazio. Se nunca, seria pra sempre. Se antes, seria agora. Se algo, seria qualquer. Se onde, seria aqui.

Se fosse estrela, seria cadente. Se fosse grata, seria infinita. Se eu, se nós, se tudo. Se desse, dará. Se Deus...quiser.

Se fosse um dia, seria este, se fosse uma hora, seria esta. Se fosse alguém, hoje, seria Eu.

SAT NAM ;)

20.8.08

Inveja

Tenho uma inveja danada de gente simples. Quando digo simples, quero dizer descomplicada. Gente que olha para o que é aceita e fica feliz. Gente que vê o que tem, acha suficiente e aprveita. Gente que em vez de querer sempre mais e melhor, cultiva a não cobrança e vive com um estilo de vida leve. Tranquila. Fluida.

Palavras que me remetem à um rio cristalino, correndo geladinho numa água trasnparente e encorpada, sob um céu azul intenso. Sem medo das curvas, das chuvas, das cachoeiras, de nada. Nada. Sem medo, sem asiedade, sem pressa e sem apatia.

Simplesmente seguindo seu rumo óbvio e nem por isso menos nobre, seu destino que até parece não ter sido escolha, porém é louvado com a graça de uma certeza abençoada...o MAR.

E o dia em que suas águas tornar-se-ão sagradas não lhes é motivo de confusão, senão de confiança.

Tenho uma inveja danada dessa gente que se sente um com o todo com tudo que tem ou não, que sente ou não, que é ou não. Um sentimento de inclusão que poucas vezes experimentei.

Que inveja de sentir plenitude num banho de mar...

SAT NAM ;)

16.8.08

Um pouco de Clarice em mim

"Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão vivas com charlatanismo. E o amor, em vez de dar, exige. E quem gosta de nós quer que sejamos alguma coisa de que eles precisam. Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece.

Sou mansa. Mas minha função de viver é feroz."

Foi a Clarice (Lispector) que disse tudo isso aí em cima.

E hoje eu acordei exatamente assim...versão dragão de mim!!!

SAT NAM ;)

14.8.08

Adpatação (Umbrella e terceiro olho)

Ufa...no fim das contas eu sempre sou salva!!!

Quando eu estava prestes a desistir - confesso, pensei MESMO nessa hipótese - a vida, que não sabe errar, começa a lançar seus salva-vidas individuais para me rebuscar.

Um dia pensando sobre arte. No Tate Modern (Museu de Arte moderna daqui de London) e minha inquietude- irritante pensou: Mas pra quê arte? Ela mesma se respondeu: Talvez seja a arte a única maneira que um ser humano tem der revelar ao próximo como é se-lô, e então, talvez seja assim a arte a única maneira que um ser humano tem de por algum olhar, mordida ou identificação, ser por um milésimo de segundo que seja um outro ser que não o seu. É, pois, a arte de um altruismo imenso, já que expondo-se permite que outro aprenda, compartilhe, descubra e de qualquer forma, registre sobre isso sua própria leitura e interpretação.

Arte é compaixão.

Compaixão que não existe num festival chuvoso, suposto dia no parque, contudo um dia Londrino e portanto, molhado, respingado, na tenda cheia, lotada, onde conseguir dançar depende da sua habilidade e categoria de fazê-lo mentalmente, já que duas pessoas, em tal situação, disputam o mesmo lugar no mesmo fucking espaço, no exato mesmíssimo tempo! O protagonismo do evento, então, fica divido entre os artistas e ela: UMBRELLA. Umbrella na tenda, dançando. Fora dela, cobrindo. No mocó, acobertando. Umbrella que não revela nada além do fato- fatídico: aqui, sua prensença é fundamental.

E o verão londrino acusa 14oC.

Enquanto isso, quero comprar minha passagem pro verão verdadeiro, real e absoluto no meu país onde 40oC a sombra em Janeiro é motivo de reclamação!!! Natal com areia de praia, cólo e cerva gelada...eu quero!

E quero também a certeza de que a opção por vir faz sentido. Rolo na cama, perco sono. O olho inchado entrega e a re-adaptação não nega. Embora a garoa caia, levanto cedo e vou. Para algum lugar desconhecido em busca de um Deus ou vários, de uma cultura de um país - que invade este daqui, e quiçá, o mundo todo - que admiro, respeito e em certos pontos me identifico: Índia!

No bairro em que "moro" provisóriamente, no trampo da Carol o chefe querido, no templo Swaminarayan (http://www.mandir.org/), o maior templo Hindu fora da ndia. Construído todo em Mármore, sem nenhum metal e apenas com trabalho voluntário.

O primeiro Deus que conheço ali, aos 11 anos saiu de casa e sobreviveu 4 anos descalça, sem roupas, dinheiro nem comida aos perigos da perigrinação até o Himalaia: frio, fome, animais e pessoas perigosas...depois meditou 40 dias apoiado em apenas uma das pernas e tornou-se uma verdadeira lenda para este povo que idolatra tantos Deuses ao mesmo tempo. Eu, por respeito escrevo seus Deuses em letra maiúscula e faço a reverência que conheço, palmas unidas em Angeli Mudrá, cabeça que abaixa discreta, com admiração.

Um laminha (ou algo parecido), me pergunta se conheço a religião e ante minha resposta negativa começa a destilar ensinamentos num inglês indianado que eu peço ao meu coração paira me ajudar a entender, já que a vontade de absorver aquilo tudo é tanta, que meus olhos enchem-se de lágrimas.

Ele tem a minha idade e resolveu há 1 ano devotar sua vida a Deus. Respeita todas as crenças, fica feliz por eu conhecer Ganesh, Shakti e Shiva e se emociona quando lhe digo que não quero ficar de costas para a sua divindade. Me ensina, trocamos. Palavras em um idoma que não é o nosso, mais que isso: trocamos pedaços descompassados de almas que querem um mundo bem melhor e acreditam nisso!

Aprendo que Buda é também um Deus Hindu - Butana - e que daí veio o Budismo. Uma corrente da religião mais antiga do mundo.

Ele me diz pra ter paciência e fé, afinal meu tempo não é o tempo de Deus. (E eu que sei disso e sempre esqueço!!!). Me aconselha a sentar ali mesmo e meditar, pedir tudo o que quero ao nosso Deus e esperar. Sem me desesperar. Tudo virá. Faço o que ele sugere. Me sinto bem melhor.

Passo um dia incrível, com garfadas orgânicas, amigos em português, goles de vinho rosé e Blues. Agradeço, ofereço malas (uma espécie de tercinho Hindu) às pessoas mais incríveis que convivo aqui e intuo: É esse o sentido da minha vinda.

É esse o sentido da MINHA VIDA!

Saio por aí de terceiro olho...Eu sou.

Sat Nam ;)

1.8.08

Parto II

Pois é...parto. Parto mais uma vez e reparto meu coração em tantos pedaços que, confesso, achei que seria mais fácil. Mas dói.

É impossível partir sem dor. Embora seja também incompatível partir sem coragem. Então, me cuido, me jogo e continuo.

A coragem põe a dor no colo e fala baixinho no ouvido da menina que chora a noite, quando a lua brilha e a irmã não está no quarto ao lado.

A dor põe a coragem no bolso, quando o metrô anda apressado, a cidade corre barulhenta, as palavras travam em algum lugar perto da garganta e a cabeça pensa: será que vou conseguir?

É então que o amor - sempre ele - pega ambas, dor e coragem, pela mão, mostra a vista da janela, o céu que não está tão azul, o vento que ensaia um balé de árvores e sonhos, os olhares tão necessitados daquela felicidade fácil que já se esqueceu de ter.

Mas não eu. Eu nunca me esqueço dela. De carinho de cachorrinha de manhã bem cedo, de telefonema de pai, abraço de mãe. De cerveja ou incerteza com as amigas. De risada fácil, de yoga plena, de cabeça blábláblá, respiração profunda e vida terna.

E por não me esquecer dessa felicidade simples, básica e absoluta, me acalento e me questiono se não teria sido mais fácil simplesmente ficar.

Nem por um segundo titubeio na resposta que certamente é um sim redondo. Redondo como os círculos das minhas tatuagens, redondo como nosso planeta Terra, redondo como as "Gestalts" que ficaram por aqui, outrora, junto com as malas e o visto negado.

Redondo como a redondeza de minha felicidade já tão conhecida, habituada e linda que pede mais profundidade, desconhecido e estranheza...cavuca com calma, perde a paciência, mas não perde a alma.

Que sem dúvidas, não há certezas. Apenas bençãos, milagres e vida.

Pois é...

Sat Nam ;)