28.6.11
Um trem pro inferno
7.4.11
Bye Bye London
Entro mais uma vez uma vez naquele trem apertadinho. A Jubilee line tem cheiro de melissinha nova. Os Beatles cantam Let It Be. Uma negra de unhas enormes e brilhantes chupa barulhentamente o canudinho do seu frappe do Starbucks. Um homem braquelo muito compenetradamente lê um livro que não consigo ver a capa. Um hermano, maybe da Venezuela, Chile ou Equador, dorme pesado com a cabeça encostada no vidro, provavelmente depois de um longo domingo de trabalho. Uma senhora de cabelos acinzentados faz palavras cruzadas. Um casal de namorados namorica. Um grupo de japoneses entra e sai tirando fotos. Em London Bridge o trem enche, uma mulher com um carrinho de bebê, um bebê que dorme. Em Green Park deixo todos eles pra trás e vou subindo a escada enquanto o Keane susurra que ‘Everybody is changing and I can’t feel the same’. Embora eu sinta a mudança brusca que me espera, ainda que o estado de ansiedade me poupe de realizá-la completamente. Um grupo de adolescentes italianos fala alto e interrepompe o caminho enquanto os guias tentam se achar com o mapa do tube na mão. Excuse me, please. Deixem o lado esquerdo pra quem tem pressa. I am sorry about that. (But I am not. Not really. Not deep inside). Me apresso em chupar Londres até o caroço. Mas não se apresse – respire – em ser tão estressado como tudo nesta terra em que até as nuvens correm e os minutos duram apenas 30 segundos. Alanis me pergunta se isso não é irônico e em frente ao mesmo Ritz em que Julia Roberts e Hugh Grant fazem aquela cena de ‘Nothing Hill’ espero pelo 19. De Fisbury Park a Battersea. Do segundo andar do bus vejo toda gente que se atropela com suas umbrellas, tentando se livrar da chuvinha-estraga-cabelo. O Hide Park joga charme pros ciclistas, e, principalemente, pras mulheres que pedalam de salto-alto. Na frente da embaixada da Libia a calçada está vazia, apenas alguns carros da Polícia e um cartaz meio rasgado escrito qualquer coisa da qual só consigo ler freedom. Freedom. A próxima estação é Knightsbridge. Viramos antes da Harrods. Sloane Road e toda a alta costura Italiana se esfrega na minha cara. Até parece um presságio. Acaba de dar 6 da tarde e o volume de gente na rua triplica. Já não consigo distinguir personagens na massa semi-humana que se move amorfa em passos corridos, quase desesperados. I’ve got the right to be wrong, vai gritando a Joss Stone, and I don’t wanna be another brick in the wall – e a fabrica do Pink Floyd, ali, meio de lado na minha janela, todo o dia me lembra disso - enquanto no contorno de Sloane Square avisto um pub já lotado. Gente engravatada, ternos em tons de cinza, barras curtas pra escapar das poças, gravatas cor-de-rosa, lilás, azulzinha. Pint. Shot. Shot. Shot. Tudo pra deixar a frieza de lado e expressar algo que seja. Entramos na King’s Road e acho fantástica a quantidade de gente que enfia o terninho na mochila, se transforma em atleta e vai pra casa na versao maratonista. Força de vontade, au-au. Uma em cada 2 pessoas está ao telefone. Falando alto, falando sozinho, falando-ouvindo. O som da sirene atravessa o fone, ardido. Belle and Sebastian invadem o shuffle cantando alguma coisa que desconheço, mas fazendo efeito trilha-sonora com a voz rouca que se harmoniza a minha pré-nostalgia. Já tenho muuuuuuuuita saudade de Londres. Mas não da massa amorfa. Quando voltei do Laos, me liguei que tenho muito mais dó daquela gente zumbizenta que se aperta pra entrar em Vitoria station as 8:30 da manhã do que daquela gente que vive com menos de um dólar ao dia, mas pelo menos não tem que esmagar a cara no vidro de um vagão claustrofóbico nos intestinos de uma cidade cinza. Beaufort Street. Pára o ônibus que eu quero descer, quero comprar água e digestives no Tesco, quatro latinhas de fosters e humus com cenoura. Fish and Chips, definitely maybe. Vou caminhando e cantando e sentindo o Ground Control pro Major Tom. O sol, numa de suas 15 aparições anuais na cidade, interpreta uma saída triunfante. Paro na Battersea Bridge e contemplo seu reflexo no belo Tâmisa, mare cheia, enquanto as pessoas correm, pedalam, dirigem, passeiam com o cachorro, carregam sacolas, caminham, vivem…busy. Sinto no rosto toque do vento chilli que não abandona esta ilha nem mesmo no verão e calculo que existe uma vibração maternal, uma coisa meio uterina do elemento água que circunda, embeleza e dá leveza e fluidez pra esta cidade tão forte. A correnteza do Tâmisa passa e a vida se afirma com ela. É a certeza de uma saída no meio da selva de tijolinho a vista. Ainda que a retirada nunca aconteça. Atravesso a ponte, agredeço Buda que se faz vizinho na pagoda do Battersea Park. Ahhhhh, o Battersea Park! Vou sentir saudade dele. O céu agora está de um pink inédito, meio alaranjado, pincelado de tons violeta. E o major Tom diz que Planet Earth is Blue and there is nothing he can do. And there is nothing I can doooooooooo. As daphadales sorriem trazendo a primavera ainda que se esforçando pra que o vento não as depedace. As cerejeiras parecem cobertas de neve. As flores, tantas flores que eu não sei o nome…cores de almodóvar, cores de Frida Kalo, cores. Adriana Calcanhoto invade minha bye bye London playlist…e eu vejo tudo enquadrado. Entro mais uma vez em casa e o cheiro de home sweet home vem do perfume de pasta ao pesto. Seria um outro presságio? Remoto controle…
Sat Nam ;)